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19.2.22

SOBREIROS. FIZERAM MAL A ALGUÉM ?

 

Quercus contesta abate de 1079 sobreiros para nova central fotovoltaica no Alto Alentejo

Sobreiros. Foto: paul Barker Hemings / Wiki Commons

A organização ambientalista considera “inaceitável” o aval do ministro do Ambiente quanto à localização da nova infraestrutura e lembra que o ICNF emitiu parecer desfavorável ao projecto.

De acordo com a Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza, o ministro do Ambiente, João Matos Fernandes, declarou esta terça-feira a “imprescindível utilidade pública” do projecto de instalação da Central Solar Fotovoltaica de Margalha, no concelho de Gavião, no Alto Alentejo, o que permite o abate de 1079 sobreiros – espécie protegida por lei – num terreno de 15 hectares.

“Existem alternativas de localização que permitiam a preservação do montado de sobro que não foram consideradas”, defende a associação em comunicado, qualificando como “inaceitável” o conteúdo do despacho n.º 2021/2022. A Quercus pondera avançar com uma acção na justiça “para salvaguardar o nosso mais importante património natural”, o sobreiro.

O despacho publicado publicado a 15 de Fevereiro em Diário da República, assinado pelo ministro do Ambiente, “favorece a empresa promotora Amargilha, Unipessoal, Lda., (Grupo Akuo) na qualidade de arrendatária de vários prédios rústicos” localizados no concelho de Gavião, indica a organização não governamental, que refere que “o Governo considerou o empreendimento de relevante interesse público, económico e social, na senda do cumprimento do objetivo da neutralidade carbónica”.

No entanto, sublinha, o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), através da sua Direcção Regional do Alentejo, emitiu um parecer desfavorável ao projecto da nova central solar. Esse parecer – citado pela Quercus – refere que “a legislação apenas contempla a possibilidade de conversão de povoamentos de sobreiros e/ ou azinheiras (excetuando empreendimentos agrícolas de relevante e sustentável interesse para a economia local), quando se trata de obras de imprescindível utilidade pública, aspeto que ficou por demonstrar”.

O parecer desfavorável emitido pelo ICNF na Comissão de Avaliação é aliás referido pela Declaração de Impacte Ambiental (DIA) do projecto. Entre as questões levantadas, está o facto de não ter sido apresentado “o correto levantamento de todos os exemplares de sobreiro” e também o número de sobreiros georreferenciados que vão ser afectados pela nova central – 4.074 sobreiros adultos e jovens com altura superior a 1 metro – “dando origem a um impacte negativo, muito significativo, de magnitude elevada e não minimizável.”

O instituto que tutela a área de conservação da natureza, segundo a Quercus, alerta também para a área de abate em povoamento de sobreiro apurada pela sua Direcção Regional do Alentejo (DRCNF Alentejo), num total de 63 hectares, “o que configura um impacte negativo, muito significativo, de magnitude elevada, não minimizável”.

Por outro lado, “não foi apresentada no EIA qualquer alternativa do projecto fundamentada na grande afectação de floresta de produção, circunstância que não é aceitável atendendo ao impacte deste projecto sobre o património natural”, considera a mesma entidade.

Ainda assim, a Agência Portuguesa do Ambiente, que licencia os projectos neste âmbito, propôs a emissão de uma DIA favorável ao projecto da nova central solar fotovoltaica, “contrariando pareceres de autoridades administrativas.”

Imprescindível utilidade pública “ficou por demonstrar”

Segundo a Quercus, o parecer do ICNF considera também que não foram estudadas alternativas de localização aos povoamentos de sobreiro, pelo que “não ficou demonstrado que o empreendimento pudesse ser declarado de ‘imprescindível utilidade pública’, como o ministro Matos Fernandes veio agora reconhecer politicamente”.

A associação critica também os impactos previstos devido à nova Linha Elétrica de Muito Alta Tensão a 400 kV, no âmbito do projecto, que se vai desenvolver “ao longo de 21 quilómetros num território onde predomina o eucalipto, pinheiro-bravo e montado de sobro”.

“O sequestro e armazenamento de carbono efetuado pelos sobreiros, de forma renovável com a extracção da cortiça para múltiplas aplicações, associado à amenização do clima provocado pelo coberto do montado, são essenciais no combate à desertificação e às alterações climáticas no Alentejo”, reforça a ONG.

Neste momento está prevista também a instalação de outra grande central solar fotovolaica numa área de 347 hectares no concelho de Penamacor, “que levará ao corte de 54 sobreiros e 395 azinheiras”.

“A dispersão de projetos fotovoltaicos em espaços florestais, sem que sejam estudadas alternativas, vai afectar o ordenamento do território, a paisagem, a biodiversidade e a qualidade de vida das populações”, critica a associação, que defende que têm de ser criadas regras baseadas em critérios de sustentabilidade e ordenamento do território, com a produção de preferência descentralizada em edifícios e áreas já artificializadas” e não com grandes centrais dispersas no território – “situação que não foi salvaguardada nos últimos leilões solares”.