"A Direita descaracterizou-se. Passou a ter vergonha de defender valores"
Ossanda Liber é
a líder da Nova Direita, que, em março deste ano, entregou as
assinaturas suficientes para formalizar o partido. Nasceu em Angola, foi
candidata autárquica em Lisboa e, agora, quer liderar uma renovação à
Direita.
© Tiago Ventura Sales
Política Ossanda Líber
As assinaturas foram apresentadas junto do Tribunal Constitucional em março deste ano e, agora, o primeiro grande desafio eleitoral - as eleições europeias de 2024 - aproxima-se a alta velocidade.
Liber, que diz querer "parar a ofensiva 'woke'" e reduzir impostos, nasceu em Angola, mudou-se para Paris e acabou por instalar-se em Portugal. Estudou Direito, mas dedicou-se principalmente ao mundo do cinema e, depois, aos negócios. Foi candidata às eleições autárquicas em Lisboa pelo movimento 'Somos Todos Lisboa' (onde arrecadou 0,36% dos votos) e, agora, quer renovar a política em Portugal, tanto globalmente como, com especial ênfase, à Direita.
O que traz de novo a Nova Direita ao panorama político português, principalmente à Direita?
A nossa missão é clara: defender a nossa identidade, a nossa independência e a nossa liberdade. Estas são as premissas indispensáveis ao crescimento sustentável de Portugal, à coesão social, à preservação da nossa cultura e à afirmação de Portugal no mundo.
Ao contrário dos velhos partidos, nós defendemos a causa portuguesa com a força do otimismo. Somos patriotas no sentido mais completo da expressão: acreditamos que este país não chegou ao fim dos seus dias, que não está condenado ao esquecimento, à irrelevância, à pobreza e à emigração, e que temos o potencial para voltar a ser uma grande nação.
Diz-se que a China pensa há mil anos; Portugal, infelizmente, é como se pensasse há cinco minutos
O que mais me motivou politicamente foi constatar que o país não tem desígnio, estratégia ou sentido de missão. Diz-se que a China pensa há mil anos; Portugal, infelizmente, é como se pensasse há cinco minutos. Tudo, da nossa política energética, à total e irrefletida viragem para a Europa, ao endividamento extremo do Estado ou à política de imigração louca deste Governo o indicia. Precisamos de melhor, e a Nova Direita vai ser isso.
Acha que a Direita tem falhado para com Portugal nos últimos anos? É por isso que funda este novo partido?
Sim, a Direita descaracterizou-se. Passou a ter vergonha de defender os valores em que acredita. Deixou cair a palavra ‘pátria’. Vendeu-se a chavões. Rege-se pelos 'soundbites'. É uma direita de reação, incapaz de pensar e de propor.
Com a Nova Direita, o que quero é que renasça a Direita que os portugueses gostam e querem: forte, sem medos e sem tibiezas, mas pragmática, responsável e respeitável.
Outro motivo que afastou os portugueses da Direita foi o facto de os partidos terem abdicado do cariz social que deve ser intrínseco a qualquer força política portuguesa, independentemente do espectro ideológico em que se enquadre.
Nós, além de sermos um povo de formação cristã, somos também um país em que 42% da população seria pobre se não beneficiasse de prestações sociais do Estado. A minha preocupação, como líder da Nova Direita, é permitir às pessoas que se libertem da pobreza e da dependência estatal, mas o ponto de partida português é o que é.
A política não pode esquecer-se disso, e deve ter como sujeito principal da sua ação as pessoas. A Nova Direita quer abraçar as pessoas, fazê-las saber que o país não desiste delas e transmitir-lhes que “estamos juntos”.
Não se consegue fazer nada de um país se a sua população não sentir orgulho e confiança
Foi candidata pelo movimento independente ‘Somos Todos Lisboa’, mas seguiu caminho com a Nova Direita. Porquê?
Porque o nosso projeto político tem âmbito nacional. A candidatura à autarquia de Lisboa foi uma candidatura independente porque a lei assim o permite. Infelizmente, para representarmos os portugueses ao nível nacional, a lei obriga à constituição de um partido político.
Neste momento, para si, qual é o maior problema do país, e como pretende resolvê-lo?
A ausência de sentido patriótico. Não se consegue fazer nada de um país se a sua população não sentir orgulho e confiança no país. Por isso, nós vamos começar por devolver o orgulho em ser português. Só assim podemos mobilizar as pessoas para as reformas que se impõem.
O sentimento de pertença a uma nação é a chave de tudo, mas isso não se faz por decreto. Faz-se combatendo a agenda dissolvente do wokismo, que é um ácido para o nosso sentido de comunidade e a nossa coesão social, e evocando as nossas conquistas passadas, explicando o nosso potencial no presente e mostrando um caminho para o futuro.
Diz-se que a política é, atualmente, pouco apelativa para os mais jovens, até porque é muitas vezes associada a casos de corrupção e compadrio. O que é que, a seu ver, levou a isto, e como é que pretende combater isso com a sua própria estrutura política?
Por um lado, é bem verdade que os últimos 50 anos foram calamitosos. Foram criadas expectativas de democracia e de prosperidade que a III República não soube realizar. Na verdade, ano após ano assistimos à destruição das instituições e à degradação da qualidade de vida das pessoas.
Os jovens também constatam que, ao contrário deles, os seus pais puderam comprar uma casa. Veem-se forçados à emigração, o que é sintoma do falhanço desta classe política e resulta numa perda terrível, insuportável, de capital humano para nós. Estamos em 2023, e Portugal será em breve ultrapassado em PIB per capita pela Roménia - a III República arrisca-se a fazer de nós o país mais pobre da Europa. Não nos admiremos, portanto, do descrédito em que a política se encontra.
A estratégia da Nova Direita passa por convocarmos diariamente os jovens para a causa portuguesa, para que sejam eles mesmos os autores do seu destino, participando ativamente na política e por meio desta nas decisões que lhes dizem respeito.
Os jovens querem estar neste combate: querem um país soberano, querem um país próspero, querem um país que proteja a sua identidade, querem uma política de imigração exigente, querem uma ecologia responsável e compatível com o desenvolvimento económico. Os resultados que temos tido demonstram isso claramente. Nós queremos um país com futuro, e os jovens também o querem. A casa deles é aqui.
Quais são os próximos passos da Nova Direita?
Aguardamos ansiosamente pela formalização do partido. Enquanto isso, estamos a trabalhar nas ideias, na implantação e na conquista de espaço mediático.
As Europeias de 2024 serão o nosso primeiro grande desafio eleitoral.
Os portugueses veem-me como aquele enteado que é mais leal à casa do que alguns filhos de sangue
Como pretende atrair altos quadros para o seu partido, dada a sua jovem idade?
Já estamos a atrair quadros bastantes valiosos. Há quem perceba o que estamos a construir e sinta que a mudança se fará a partir daqui.
Acha que as suas origens em Angola podem influenciar a visão que o eleitor comum tem de si?
Acho que sim, pela positiva. Os portugueses veem-me como aquele enteado que é mais leal à casa do que alguns filhos de sangue. Não me parece que haja alguma dúvida sobre o meu sentido de pertença a este país. Além de aspetos históricos e de vida, eu sou portuguesa porque quero ser portuguesa. Escolhi sê-lo. E isso, acho eu, vale muito.
Há poucas pessoas afrodescendentes na política portuguesa, tanto à Esquerda como à Direita. Porque é que acha que é assim?
Penso que há algum receio de rejeição por parte dos portugueses de outras origens. Convenhamos, é preciso muita coragem e destemor. No entanto, penso que quando estes portugueses me veem nos cartazes, muito provavelmente pensam: “Se ela consegue eu também consigo”. Em todo o caso, espero que assim seja.
Como é que, no seu caso pessoal, se salta do Direito para o Cinema, daí para os negócios e depois para a política? É um caminho, no mínimo, eclético.
O Direito foi por obrigação, o cinema foi uma paixão, os negócios uma necessidade e a política é convicção. Eu sou um ser humano comum e como tal passei por todas as fases, e ainda bem. É graças ao meu percurso pessoal profissional que me sinto preparada para servir Portugal e os portugueses.