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16.5.20

MATO ROMÃO


MATO ROMÃO ANO 2013 ( Foto de J.P.L. )    
BELEZA FORA DO NORMAL. MATO ROMÃO ( Foto de J.P.L. ano 2013 )
 
Mato Romão é toda a extensão de terreno situada entre Birre - S. Gabriel - Bairro Chesol e  a Areia, localidades da Região de Cascais.

Trata-se de um espaço ainda não coberto de moradias.

Esteve para ser construida aqui uma Academia, porém o projecto não foi para a frente.


quarta-feira, 9 de julho de 2014

Mato Romão, um mato deveras apetecido!

            Ainda sou do tempo em que o Mato Romão era mesmo mato, como o nome dizia, e tudo eram pedreiras onde, a 28 de Junho de 1968, viria a ser inaugurada, com pompa e circunstância, a Standard Eléctrica e, mais acima, bastantes anos depois, a Cooperativa Chesol, destinada primordialmente a trabalhadores da Estoril Sol.

            Ainda sou do tempo em que o Mato Romão era mui alegremente batido nos primeiros dias de caça pelos caçadores das redondezas, que, ao final do dia, dali traziam bons coelhos pendurados ao cinturão!
 
            Ainda sou do tempo em que, pelo Verão, para o Mato Romão se faziam fogos reais da artilharia de costa e eu ouvia os obuses (não sei se era assim que se chamavam…) zunir por cima de minha casa em Birre, e no Mato Romão abriam crateras, enquanto os aviões também faziam fogo para a ‘gurita’. E troava, façanhudo, o «canhão de Alcabideche» e tínhamos de deixar as janelas abertas para os vidros se não estilhaçarem com o forte sopro do tiro!
 
 
           
 
 Ainda sou do tempo em que um autarca quis planear para ali uma ‘cidade do cinema’ e o Povo se alevantou, porque (argumentou-se veementemente) aquilo é Reserva Ecológica Nacional, Reserva Agrícola Nacional, aquilo é dos poucos nichos ecológicos da freguesia de Cascais, onde a passarada nidifica, as aves de migração se acoitam, cobras e lagartos prosperam, nasce o Rio dos Mochos e onde, devido à sua permeabilidade e aos carrascais que tem, se retêm as águas pluviais que vão alimentar o nível freático e assim não vêm por aí abaixo a inundar Birre e a bacia hidrográfica desse «rio» (assim o Povo lhe chama) até ao Parque Marechal Carmona.
 
 
            Ainda sou do tempo em que, por via da tal ‘cidade do cinema’ e dando ouvidos a astutos interesses imobiliários, até se quis prolongar a A5 até ao Guincho e o Povo alevantou-se, gritou e o Executivo Municipal meteu a viola no saco e deixou o caso a aboborar e até se esqueceu que precisava de pôr um termo condigno à auto-estrada, depois de ter procedido, até, a uma série de expropriações dos terrenos derredor.
 
 
            Ainda sou do tempo em que uma candidatura à Câmara ganhou a maioria por ter garantido ao Povo que estancaria rapidamente e em força (para usar uma expressão bem conhecida…) essa cegueira de construir, construir, construir e transformar o território cascalense em mar de cimento armado, porque não havia água que chegasse, ecologia que o permitisse, clima que o proporcionasse e até casas se tinham já de sobejo!…
 
 
            E estou a ser do tempo em que, mais uma vez, olhos cobiçosos se lançam sobre o Mato Romão, ali mesmo à saída da auto-estrada, com os ares da serra tão por perto e o mar do Guincho assaz apetitoso… E até se poderia dar ali guarida a uma entidade humanitária e cultural e respeitar índices previstos no Plano Director Municipal e musealizar uma pedreira (!)…
 
 
          
 
  Dizem-me que há forças políticas que estão contra. 
 
Dizem-me que há mesmo uma petição a correr na Internet; que já se escreveram artigos nos jornais, já se ouviram opiniões pró e contra; que a discussão se mantém tão viva como aquela da Quinta dos Ingleses; mas… argumentos há muito fortes!
 
 
            E o Mato Romão da minha infância e de minha velhice vai mesmo deixar de existir.
 
 
            Guardarei saudades do tempo em que, numa tarreta de cortiça, ali, por veredas e atalhos, levava o almoço a meu pai.
 
            Lembrarei os tempos em que a rapaziada até ali ajudava a apascentar rebanhos de ovelhas e de cabras.
 
            Ficar-me-á na memória o cheiro acre a trovisco, onde armava as ratoeiras às felosas brancas Setembro afora.
 
            Recordarei o aroma das sacadas de bagas de zimbro que por ali apanhei e cujos tostões nos serviam para um pirolito na taberna do Torretas ou na mercearia do David.
 
            Sentirei, de quando em vez, o sabor dos murtinhos silvestres de um cinzento arroxeado que nos deliciavam…
            Guardarei saudades, lembrarei os tempos, recordarei os aromas… E estou a ser desse tempo dos olhos cobiçosos…
 

Publicado em Costa do Sol – Jornal Regional dos Concelhos de Oeiras e Cascais, nº 53, 09-07-2014, p. 6.

 Nota:  As fotos foram retiradas do livro «Cascais e os Seus Cantinhos».