" Um vasto matagal entresachado ", assim definiu o historiador Costa Lobo o Portugal do século XV. Outro tanto se poderia afirmar para as épocas anteriores. Florestas e brenhas cobriam grande parte do País, convertendo-se em óptimo refúgio de feras e de animais bravios.
Aqui e além vislumbrava-se um montículo de casas, centro periférico de alguns campos arroteados que lhe sustentavam a população.
É verdade que o Minho, a Estremadura ou certas zonas litorais nortenhas escapavam um pouco a esse panorama desolador. Aí existia dispersão de povoamento, aldeias ainda mais pequenas mas casais espalhados pelos vales, pelas faldas das montanhas e pelas raras planícies.
A população era escassa; um milhão de habitantes ou pouco mais, distribuindo-se irregularmente de norte a sul, atingindo máximos e mínimos de densidade onde ainda hoje os atinge, não excedendo na média os onze habitantes por quilómetro quadrado. Houve, é certo, subidas e descidas ao longo dos três séculos do Portugal medieval.
O milhão de base pode ter sido suplantado entre os meados do século XIII e os meados do século XIV, quando a paz e a prosperidade do reino se sucederam aos tempos árduos da Reconquista; mas baixou também desde a Peste Negra de 1348, ou mesmo antes, para só recompor uma centúria mais tarde. (... ) Neste Portugal vivia um milhão de pessoas hierarquizadas em classes, subclasses, grupos e subgrupos. Havia a nobreza, o clero e o povo. (...)
Toda esta gente vivia de maneira diversa da nossa.
Alimentava-se, vestia-se, divertia-se segundo outros padrões.
Habitava em casas diferentes.
Tinha outro nível de vida e outra forma de passar o tempo.
Nem sequer o concebia, de resto como nós hoje.
O tempo era mais impreciso, menos necessário numa contagem rigorosa, menos nítido nos seus contornos e na sua utilidade.
O tempo era o sol e era a treva.
Não havia relógios mecânicos. As divisões básicas do dia e da noite correspondiam apenas a cerca de um terço das que hoje existem.
(...) Os anos de 1422 a 1460 foram vividos e contados duas vezes; a primeira quando ainda vigorava a era de César; a segunda, quando passou a vigorar a era de Cristo.
Gostariamos de saber como esta gente se comportava perante uma alegria ou uma tristeza; qual a expressão normal dos sentimentos; quais as possíveis diferenças sociais e económicas que os condicionavam.
Vida e morte, tratamento de uma e prevenção da outra, atitude frente ao sobrenatural, interesse pelo próximo, individualismo e colectivismo, código moral, tudo são aspectos do quotidiano em regra omitidos pelos historiadores das estruturas e dos acontecimentos. ( ...) 1
1- Do livro " A Sociedade Medieval Portuguesa
Autor. A.H.de Oliveira Marques
Livraria. Sá Da Costa. Editora. 2ª Edição. 1971
Imagem de; medievalist
Aqui e além vislumbrava-se um montículo de casas, centro periférico de alguns campos arroteados que lhe sustentavam a população.
É verdade que o Minho, a Estremadura ou certas zonas litorais nortenhas escapavam um pouco a esse panorama desolador. Aí existia dispersão de povoamento, aldeias ainda mais pequenas mas casais espalhados pelos vales, pelas faldas das montanhas e pelas raras planícies.
A população era escassa; um milhão de habitantes ou pouco mais, distribuindo-se irregularmente de norte a sul, atingindo máximos e mínimos de densidade onde ainda hoje os atinge, não excedendo na média os onze habitantes por quilómetro quadrado. Houve, é certo, subidas e descidas ao longo dos três séculos do Portugal medieval.
O milhão de base pode ter sido suplantado entre os meados do século XIII e os meados do século XIV, quando a paz e a prosperidade do reino se sucederam aos tempos árduos da Reconquista; mas baixou também desde a Peste Negra de 1348, ou mesmo antes, para só recompor uma centúria mais tarde. (... ) Neste Portugal vivia um milhão de pessoas hierarquizadas em classes, subclasses, grupos e subgrupos. Havia a nobreza, o clero e o povo. (...)
Toda esta gente vivia de maneira diversa da nossa.
Alimentava-se, vestia-se, divertia-se segundo outros padrões.
Habitava em casas diferentes.
Tinha outro nível de vida e outra forma de passar o tempo.
Nem sequer o concebia, de resto como nós hoje.
O tempo era mais impreciso, menos necessário numa contagem rigorosa, menos nítido nos seus contornos e na sua utilidade.
O tempo era o sol e era a treva.
Não havia relógios mecânicos. As divisões básicas do dia e da noite correspondiam apenas a cerca de um terço das que hoje existem.
(...) Os anos de 1422 a 1460 foram vividos e contados duas vezes; a primeira quando ainda vigorava a era de César; a segunda, quando passou a vigorar a era de Cristo.
Gostariamos de saber como esta gente se comportava perante uma alegria ou uma tristeza; qual a expressão normal dos sentimentos; quais as possíveis diferenças sociais e económicas que os condicionavam.
Vida e morte, tratamento de uma e prevenção da outra, atitude frente ao sobrenatural, interesse pelo próximo, individualismo e colectivismo, código moral, tudo são aspectos do quotidiano em regra omitidos pelos historiadores das estruturas e dos acontecimentos. ( ...) 1
1- Do livro " A Sociedade Medieval Portuguesa
Autor. A.H.de Oliveira Marques
Livraria. Sá Da Costa. Editora. 2ª Edição. 1971
Imagem de; medievalist